Sob forte pressão da Casa Branca, o Serviço de Imigração e Controle de Alfândegas (ICE) tem ampliado de forma expressiva suas operações nos Estados Unidos, com foco não apenas em indivíduos com antecedentes criminais, mas também em imigrantes sem histórico de delitos. A guinada vem acompanhada por mudanças internas estratégicas: nesta quinta-feira (29), o governo Trump anunciou a troca de comando nas duas principais divisões da agência, reforçando sua meta de atingir ao menos 3 mil prisões por dia.
Kenneth Genalo, chefe da divisão de Execução e Remoção (ERO), responsável por localizar e deportar imigrantes irregulares, foi substituído por Marcos Charles. Já na divisão de Investigações de Segurança Interna (HSI), que tradicionalmente combate crimes transnacionais, Robert Hammer deu lugar a Derek Gordon, após parte de sua equipe ser redirecionada para apoiar ações de deportação. Segundo o ICE, o realinhamento visa "cumprir o mandato do presidente Trump e manter as comunidades seguras".
Na prática, o que se vê é uma escalada nas ações do ICE em estados como Califórnia, Texas, Massachusetts e Flórida. Em maio, a maior operação da história da agência — batizada de "Operation Patriot" — prendeu 1.461 pessoas em Massachusetts, inclusive em áreas conhecidas como "cidades santuário", que tradicionalmente se recusam a colaborar com deportações federais.
Entre os alvos da operação estavam assassinos, estupradores e traficantes de fentanil. Inclusive um brasileiro de 29 anos acusado de pedofilia e sequestro, outro brasileiro de 32 anos procurado pela Interpol por tráfico de drogas, e um terceiro, de 24 anos, procurado por assassinato.
Embora 790 dos detidos tivessem antecedentes criminais, dados indicam que mais de 40% não tinham qualquer histórico de crimes, a não ser a própria situação migratória irregular. Como um jovem pai brasileiro de um bebê de 4 meses, deportado para Fortaleza após buzinar para o veículo de um agente do ICE disfarçado.
A operação, que contou com o apoio do FBI e outras agências federais, também gerou protestos locais. A governadora de Massachusetts, Maura Healey, classificou a prisão de um estudante do ensino médio brasileiro como "inaceitável" e criticou duramente o governo federal por "espalhar medo e insegurança".
Relatos de campo reforçam essas preocupações. Grupos de defesa dos direitos civis denunciam prisões em restaurantes, canteiros de obras e até em áreas residenciais, muitas vezes sem mandado judicial. Em diversas cidades, crianças ficaram sem os pais na saída das escolas, comerciantes perderam funcionários e famílias inteiras foram separadas abruptamente. A retórica oficial, centrada na segurança pública, entra em choque com a realidade vivida por comunidades que há décadas fazem parte do tecido social e econômico do país.
Para especialistas, o aumento da repressão representa não apenas um desvio de prioridades, mas uma violação de princípios legais e humanitários. Enquanto o ICE acelera sua máquina de deportações, a tensão cresce nas ruas, nas escolas, nos locais de trabalho e nos lares de milhões de imigrantes. A mensagem do governo é clara: a era da tolerância acabou. Mas para muitos, o custo dessa política será pago em fragmentos de vidas desfeitas, sonhos interrompidos e uma nação dividida.