Nos últimos anos, o Brasil tem enfrentado um fenômeno tão silencioso quanto alarmante: a fuga de seus milionários. Segundo o relatório de 2024 da Henley & Partners, o Brasil figurou como o 6º país no mundo com maior saída líquida de indivíduos de alto patrimônio — perdendo cerca de 800 milionários em 2024 e, segundo projeções, 1.200 em 2025, levando consigo aproximadamente US$ 8,4 bilhões em capital. Mais do que cifras, essa debandada representa um esvaziamento de talentos, de poder produtivo e de confiança na direção do país.
Os motivos da fuga
Os principais fatores que alimentam essa evasão são instabilidade política, insegurança jurídica, carga tributária elevada, violência urbana, incertezas fiscais e baixa qualidade nos serviços públicos, especialmente saúde e educação. O medo de reformas confiscatórias e de perseguições tributárias também afasta empresários e investidores. Soma-se a isso a percepção de que o ambiente de negócios no Brasil se deteriorou, com aumento da burocracia e falta de previsibilidade regulatória.
Destinos preferenciais
Os milionários brasileiros não saem aleatoriamente: eles fogem para destinos seguros e estáveis, com regras claras, proteção patrimonial e boa qualidade de vida. Estados Unidos (especialmente Flórida), Portugal, Emirados Árabes, Uruguai, Panamá e ilhas do Caribe figuram entre os destinos mais procurados. Esses países oferecem residência fiscal facilitada, proteção jurídica e sistemas tributários mais amigáveis.
O que o Brasil perde com isso?
Essa evasão representa mais do que perda de dinheiro. O país perde investimento produtivo, empregos de qualidade, inovação e poder de influência internacional. Cada milionário que parte leva com ele não apenas recursos financeiros, mas também empresas, startups, escritórios, fundações e redes de influência que movimentam cadeias inteiras de valor.
Dano intelectual
O êxodo também afeta a elite intelectual e empresarial do país: empresários, executivos de alto nível, pesquisadores e líderes industriais. Com a saída de cérebros estratégicos, o Brasil perde capacidade de decisão, formulação de estratégias, transferência de conhecimento e desenvolvimento tecnológico. Isso compromete não apenas o presente, mas o futuro do país.
Impacto no emprego
A fuga de capital humano e financeiro compromete diretamente o crescimento de empresas nacionais, o que implica menos contratações, fechamento de unidades produtivas e estagnação no setor privado. Cada milionário que se vai pode significar dezenas — ou centenas — de empregos diretos e indiretos perdidos no país.
Impacto na arrecadação
A saída dessas fortunas implica em queda direta na arrecadação de impostos, especialmente sobre renda, patrimônio e consumo de luxo. Perdem-se também impostos indiretos oriundos de investimentos, doações, heranças e grandes aquisições, gerando rombos no orçamento público e ampliando a dependência do Estado sobre a classe média.
Impacto na imagem do país
O Brasil passa a ser visto como um país hostil aos empreendedores e à prosperidade. A fuga dos mais ricos é lida pelo mercado internacional como sinal de desconfiança estrutural, o que afasta investidores estrangeiros e compromete negociações comerciais. O país assume, assim, a imagem de ambiente de alto risco para negócios e para preservação de patrimônio.
Por que não conseguimos reter nossos líderes?
O Brasil não consegue reter seus milionários e líderes industriais porque não oferece previsibilidade, respeito à iniciativa privada nem meritocracia real. Em vez de reconhecer o papel transformador da elite produtiva, muitas vezes a trata com hostilidade ideológica e jurídica, afastando quem gera valor, inovação e prosperidade. Falta um ambiente que celebre o sucesso honesto e promova segurança para o crescimento.
Impacto na economia e na dívida interna
Com a saída de capitais, há menos investimento doméstico, menor circulação de riqueza e maior pressão sobre o crédito público, o que alimenta o aumento da dívida interna e compromete a capacidade de financiamento do Estado brasileiro. O sistema financeiro fica mais concentrado e dependente do Tesouro, o que enfraquece a autonomia monetária e a sustentabilidade fiscal.
E o impacto no PIB?
A longo prazo, essa evasão afeta o Produto Interno Bruto, pois reduz a base de geração de riqueza. A retração de investimentos e a ausência de grandes empreendedores impactam negativamente o crescimento, a produtividade e a competitividade global do país. Mesmo que esse impacto seja difuso, ele é real e constante — e continuará crescendo se nada for feito.
A fuga de milionários é o reflexo de um país que não protege quem produz. É muito mais do que um movimento de evasão fiscal — é o sintoma de um sistema que desincentiva a criação, pune o sucesso e sabota o mérito. Trata-se de um retrato de um ambiente onde o empreendedor é tratado com suspeita, e não com incentivo. Onde aquele que gera emprego, paga salários e movimenta a economia é frequentemente alvo de narrativas que o associam a privilégios ou exploração, quando na verdade é ele quem sustenta boa parte do desenvolvimento real do país.
Esse movimento de evasão patrimonial revela uma cultura de desconfiança crônica, onde a insegurança jurídica e a volatilidade das regras impedem o planejamento de longo prazo. Nenhum investidor permanece em um lugar onde não há estabilidade, previsibilidade ou respeito à propriedade privada. A elite financeira não foge apenas dos impostos altos — foge do risco institucional, da incerteza econômica, da sensação de que a qualquer momento novas leis podem confiscar, restringir ou demonizar seu patrimônio.
Quando um país não valoriza quem constrói, ele abre mão do seu próprio futuro. Ele deixa de cultivar líderes, inovações, indústrias e ideias que poderiam gerar milhares de empregos, novas tecnologias e arrecadação sólida. Ele passa a importar exemplos de sucesso e exportar cérebros, criando um ciclo vicioso de mediocridade. O Brasil, ao não garantir um ambiente fértil para o crescimento sustentável, não perde apenas fortunas — perde cérebros, influência e tempo. E tempo, na economia global, custa caro.
Enquanto o Brasil continuar refém de políticas curtoprazistas, tributações punitivas e discursos populistas que desvalorizam o capital produtivo, continuará sendo um país de imenso potencial desperdiçado. A verdadeira soberania econômica começa quando se entende que não há justiça social sem geração de riqueza — e não há geração de riqueza sem liberdade para empreender.